quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

O dia depois


Hoje acordei pensando, pelo menos a partir de hoje minha carga viral não aumenta mais.
Quanto tempo demora será para esse remédio fazer efeito? Será que já evitou algum CD4 de ser infectado? Quantos vírus já morreram?

Ainda senti levemente tonto, mas muitíssimo pouco durante o dia. Fiquei impressionado com praticamente não ter tido efeitos colaterais. Realmente parece ser algo tolerável. É algo que me deixou feliz, apesar de ter lido que esse efavirenz pode causar depressão. Acho bem improvável que me atinja, porque já tomo antidepressivo há um bom tempo.

Notei há dois dias que as pintas vermelhas no corpo e braços vem diminuindo aos poucos ficando mais claras, mas que elas ficam bem visíveis se faço algum esforço mais brusco que me faz suar ou ficar cansado. Um banho gelado faz elas regredirem de novo. Isso é bom.

Também notei algo diferente com os linfonodos, não sei se tem algo a ver com a medicação, talvez não. Mas reparei que do lado esquerdo do pescoço ficou um pouco palpável, coisa que nunca tinha acontecido desde o começo, e o do lado direito ficou bastante inchado assim como o da nuca. Isso me deixou um pouco preocupado, mas agora a noite eles já regrediram um pouco. O da virilha ainda é palpável, mas parece que ficaram um pouco planos e bem menores, esses já não me preocupam.

O médico disse que eles iam demorar um pouco para voltarem ao normal, ou seja, quase sumirem.

Desde ontem sinto um pouco de dor nas costas e no pescoço, e meu pulso já quase não dói nada.

A primeira pílula

Ao longo que o dia ia acabando comecei ficar mais ansioso para o momento.
Marquei para as 22h. E fiquei imaginando o que poderia sentir ou não....


Continuei vendo televisão, comi algo para forrar o estômago e tomei. O comprimido é bem grandinho, parece aqueles de vitaminas ou cevada. Mas não tem gosto de nada, ainda bem.
Queria ficar acordado um tempo para ver se sentiria algo, e fui esperando até as 0h.



Senti uma leve tontura, como quando toma um copo de cerveja de estômago vazio. E fui dormir. Acordei mais tarde com um pouco de calor apesar do ar condicionado, notei que os batimentos estavam mais rápidos, que eu até podia sentir a pressão das batidas na cabeça. Aumentei a potência do ar condicionado e voltei a dormir. 
Lembro que um dos sites que li mencionava o Efavirenz causar "sonhos vívidos", pesadelos, insônia. Acho que fiquei um pouco impressionado, porque a impressão que tive foi de uma certa "viagem" com o remédio. Sonhei com uns coelhos que ficavam pulando entre os precipícios e eu podia seguir eles voando, e assim como aquele nyan cat, eles tinham um rastro colorido depois do movimento deles.  Era engraçado e estranho.



O outro sonho que lembro esse não me fez chorar no mundo real, mas eu chorava muito dentro do sonho. Sonhava com minha família, e minha irmã mais velha, que durante muito tempo sempre fomos muito próximos. Como as coisas estavam diferentes e cada um tomando seu rumo na vida, inclusive meus sobrinhos que já ficavam adultos. Esse sonho me deixou um pouco deprimido durante  o dia.

Passei bom tempo do dia lembrando aquele CD da legião urbana chamado A tempestade. 


Quando não há compaixão
Ou mesmo um gesto de ajuda
O que pensar da vida 
E daqueles que sabemos que amamos ? 
Quem pensa por si mesmo é livre
E ser livre é coisa muito séria 
Não se pode fechar os olhos 
Não se pode olhar pra trás 
Sem se aprender alguma coisa pro futuro 

A retirada

Chegado o dia da retirada.

Passei a madrugada dormindo e acordando pensando nessa hora. Dormi mal, e acordei durante várias vezes. Pensei em alguns momentos, bem que poderia não tomar esse remédio. Mas logo voltei à razão. Por mais que tenha algum efeito, é BEM melhor que morrer em decorrência da doença.

Peguei o papel e fui ao posto, passei pela frente da porta de cruzei com uma conhecida. Tinha as mãos geladas e tremia um pouco. Pensei até em ir com uma máscara daquelas de hospital e um gorro... mas chamaria mais atenção.

Fiquei aliviado ao ver o enfermeiro sair da sala para acompanhar um paciente, e antes que ele pudesse  voltar pra sala perguntei:

- Eu precisava fazer o cadastro para receber a medicação. Preciso mesmo entrar aí?
R: Você tá com a documentação?

- Estou com tudo. Posso esperar lá fora?
R: Vou pegar pra você e te entrego lá.


Ufa. Me afastei um pouco do posto e fui pra o outro lado do ambiente, mas reparei que dois homens haviam reparado minha tática. Ficaram olhando pra mim como quem pensam: "Eu sei da sua situação".

Depois de alguns minutos ele volta.

-Seu tratamento pode ser feito com um novo modelo chamado de 3 em 1 , mas ele não especificou na receita. Você quer desse? É apenas um comprimido com os 3.

-É... era justamente esse que eu desejava, vou esperar lá fora do posto, pode ser?


Ele me entregou alguns minutos depois dentro de um envelope pardo já fora do posto de entrega, um frasco numa embalagem de papel. Perguntei sobre como poderia fazer para alguém pegar a medicação no meu lugar. Ele me deu um termo de autorização em branco que deve ser entregue na próxima vez. Agradeci e fiz de tudo para sair o mais rápido do lugar.


Consulta e Prescrição

Dia 10/02 foi minha consulta de retorno e recebi as orientações sobre como tomar a medicação, e novamente perguntei algo que NA INTERNET sempre se encontra.

"A medicação irá PROLONGAR a vida do paciente portador."

"A medicação poderá causar lipodistrofia."

Das coisas que mais me assombram dessa nova condição vem o preconceito, o estigma, o medo do futuro em a medicação perder o efeito, e ficar com aparência de "aidético".

Aproveitei para repetir as mesmas perguntas que havia feito na primeira consulta:

-Existe algum risco dessa medicação perder efeito?
R: Só se você não tomar como o indicado, não aderir ao tratamento. Senão, NUNCA a AIDS irá se
desenvolver, seus níveis de defesas voltarão aos níveis de alguém sadio.

-Em alguma ocasião eu serei acometido de alguma doença oportunista?
R: Como eu afirmei, se mantiver o tratamento, nunca manifestará nada. Pegará as doenças que provavelmente já iria contrair.

-Essa medicação causa lipodistrofia?
R: Não, esses esfeitos são de uma classe de remédios anteriores, a medicação atual praticamente não apresenta mais efeitos colaterais. Alguma piora nos níveis de triglicerídeos podem acontecer, e uma leve tendência maior à osteoporose, mas isto é mais comum em mulheres.

Logo me falou qual combinação eu iria aderir. Me deu duas folhas, uma com as características de sintomas manifestados e data da descoberta e exames. E a outra uma filha de cadastro com meus dados para a central de cadastros do SUS.

Prescreveu um "coquetel" de 3 medicamentos:

Efavirenz  1cp/noite
Tenofovir  1cp/noite
Lamivudina  2cps/noite

Perguntei logo, o que eu posso sentir com cada um?

Nada com os dois últimos. O primeiro pode dar uma leve tontura, por isso é melhor tomar a noite.
Não esqueça de tomar um só dia, pois a medicação só age durante 24hrs, depois disso o vírus que se encontra latente volta a se multiplicar e pode desenvolver uma mutação que o torne mais resistente.

Ele novamente me prescreveu novos exames e pediu que eu voltasse dentro de duas semanas.

Hemograma
EAS
TGO
TGP
Bilirrubinas
Uréia
Creatinina

Resultados Hemograma/CD4/CD8/CV

Sei que hemograma não serve para fazer um diagnóstico de doenças, mas verificar se há alguma anormalidade nos padrões. O médico olhou os três, desde o de dezembro quando a suspeita sobre o linfonodo aumentado era apenas de uma possível sífilis, disse apenas que estão normais.

O gráficos mostram que o organismo começa a a declinar as defesas no leucograma e apresentar diminuição de glóbulos vermelhos também, eu vinha apresentando constante visões escuras ao fazer algum esforço.




Já que o vírus também causa anemia. Comprei um frasco de vitafor, e estou tomando um comprimido durante o almoço, e isso já refletiu pelo menos no hematócrito.




O Resultado de carga viral e CD4/8 se refere ao exame feito no dia 27/01, logo no dia posterior a primeira consulta com o infectologista. Para minha surpresa, apresentaram níveis bastante positivos e animadores, apontando que como eu desconfiava, é uma infecção bem recente. O médico disse que não posso garantir isso, mas pelas minhas suspeitas da data do contágio, bate com o tempo para manifestar a fase aguda.